Seleção legítima do Conselho para Procurador-Europeu
O ex-ministro Adjunto e do Desenvolvimento Regional do XIX Governo, Miguel Poiares Maduro, subscreveu esta semana uma carta aberta ao Parlamento Europeu com o título “Apelo ao Conselho da UE sobre a sua hipocrisia em relação ao Estado de direito”.
Neste documento, subscrito por alguns académicos, entre os quais o antigo eurodeputado Rui Tavares, é questionada a seleção legitima do Conselho Europeu de Justiça para o cargo de Procurador-Europeu, pondo-se em causa os critérios definidos pelo próprio Regulamento que institui a Procuradoria Europeia Regulamento (EU) 2017/1939 e, bem assim, a Declaração do Conselho que lhe dá execução, procedimento estranho para dois políticos que tão bem conhecem a Europa.
Desses dois documentos resulta, com total clareza, que a indicação do painel de seleção não é vinculativo para o Conselho.
Essa mesma posição foi reforçada na comunicação enviada aos Estados-membros pela Administração da Procuradoria Europeia dando conta do resultado da atividade do painel de seleção.
No caso português foi indicado e nomeado o candidato previamente escolhido pelo Conselho Superior do Ministério Público (CSMP), que desenvolveu um processo de avaliação, envolvendo um júri cuja decisão foi ratificada pelo Plenário deste órgão. A Deliberação do Plenário do Conselho Superior do Ministério Público de 28 de fevereiro de 2019, numa escala de 0 a 100, atribuiu a José Guerra o primeiro lugar, com 95 pontos. No terceiro lugar, com 81 pontos, ficou a magistrada candidata Ana Carla Almeida (em anexo a decisão do CSMP).
O Conselho Superior é um órgão com assento constitucional, constituído maioritariamente por magistrados, ao qual incumbe a gestão das carreiras e a ação disciplinar dos magistrados do Ministério Público, sendo também garante da autonomia desta magistratura.
O lugar de Procurador Europeu corresponde ao mais alto grau da hierarquia da Procuradoria Europeia. O Procurador Europeu vai dirigir a atividade dos procuradores europeus delegados que operam no território nacional e são também, para todos os efeitos, membros do Ministério Público nacional. Não é, assim, despiciendo que na escolha do Procurador Europeu se respeite os critérios padrão internamente definidos para o preenchimento de cargos de direção superior do Ministério Público.
Na avaliação feita, o percurso profissional do magistrado escolhido, não só no plano interno como na dimensão internacional, é claramente superior ao da outra candidata.
José Eduardo Guerra tem uma longa carreira no Ministério Público, tendo sido sistematicamente classificado com as notações máximas.
Dirigiu a secção do DIAP de Lisboa responsável pela investigação do crime económico-financeiro durante muitos anos, representou o Ministério Público em julgamentos relevantes na área económico-financeira e tem uma vasta experiência internacional na Eurojust, que lida com a coordenação, no plano europeu, de investigações de crimes com dimensão transnacional, nomeadamente na área económico-financeira.
É inegável a sua experiência de direção de equipas, de coordenação de investigações e de cooperação judiciária penal no âmbito da União Europeia.
A antiguidade não sendo um critério exclusivo releva quando, perante dois magistrados com a experiência pressuposta para o preenchimento de um mesmo lugar e classificação de mérito, um deles tenha uma antiguidade muito superior à do outro.
É esse o caso do magistrado José Eduardo Guerra, que na lista de antiguidades relativa à sua categoria está colocado 200 lugares acima da magistrada Ana Carla Almeida.
A superioridade curricular do Procurador José Eduardo Guerra é manifesta.
Transformar esta nomeação numa manobra de guerrilha política – com a invocação da integridade e independência da Procuradoria Europeia - constitui um erro tanto maior quanto o mentor da carta aberta foi membro proeminente de um Governo que, em 2013, fez alterar uma lei da República para interferir na nomeação do Membro Nacional Eurojust - unidade europeia de magistrados responsáveis pela coordenação de investigações do crime grave e organizado -, derrogando uma decisão do Conselho Superior do Ministério Público.
Essa iniciativa, a todos os títulos atentatória da autonomia do Ministério Público e da independência da Eurojust, não mereceu cartas abertas à Europa nem apelos contra aquilo que agora se classifica como “hipocrisia”.
O processo é público e o Governo tudo fará para que seja o mais escrutinado possível.